Na página 78 da minha edição da ‘Riqueza das Nações’ de Adam Smith leio “Não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro ou do padeiro que esperamos nosso jantar, mas da consideração que ele tem pelo seu próprio interesse.”

Entendo este pensamento como balizar para que, em uma economia capitalista, seja possível despertar o interesse do setor produtivo para, na busca de seus interesses, salvaguardar o nosso jantar.

Neste caso o ‘jantar’ é a próxima sobrevivência do homem no planeta e o projeto de lei, que tramita pelo congresso, que cria o mercado regulado de carbono no Brasil é um passo neste sentido. 

Regulamentar é preciso ...   

O mercado de carbono regulamentado é uma ferramenta importante para a redução das emissões de gases de efeito estufa e para a transição para uma economia de baixo carbono, diminuindo o impacto no meio ambiente.

... a fim de estabelecer um mercado ...

Com sua regulamentação, o carbono passa a ter preço e tendo preço, passa a existir um mercado para ele, onde a negociação gerará lucro para os que conseguirem acumular créditos de carbono, que passa, portanto, a ser uma mercadoria como outra qualquer.

... incentivando oferta ...  

Investimentos em projetos de redução de emissões, como energias renováveis ou reflorestamentos por ex, podem gerar créditos de carbono, que podem ser vendidos e gerar retornos financeiros.

... e criando demanda.

Os compradores de créditos de carbono seriam as empresas que emitissem mais que uma determinada cota pré-estabelecida de gases de efeito estufa (GEE) por ano, teriam a obrigação de adquirir créditos de carbono para compensar suas emissões.

E é isso que estabelece a Lei ...

O projeto de lei aprovado no Senado, semana passada (4), cria o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), ou seja, um sistema que regulamenta o comércio de créditos de carbono e define as empresas obrigadas a participarem dele.

... apontando o nível de emissões ...

Atividades, fontes e instalações que emitam acima de 25 mil toneladas de CO2 equivalente por ano estarão sujeitas a um limite de emissões, ainda a ser definido, enquanto aquelas que emitirem entre 10 mil toneladas de CO2e e 25 mil tCO2e terão que apresentar plano de monitoramento de suas emissões.

Um mercado enorme ...

O Relatório ‘Oportunidades para o Brasil em Créditos de Carbono’, feito pela Câmara de Comércio Internacional (ICC Brasil) em parceria com a WayCarbon estima que o Brasil pode gerar receitas de US$ 120 bi até 2030 e gerar 8,5 milhões de empregos até 2050.

... que se abre ... 

Ao criar esta regulamentação, o Brasil passará a adotar instrumentos de governança climática já vistos em outros países e ampliando sua participação na agenda da descarbonização, atraindo mais investimentos e criando oportunidades.

... valendo-se do ‘espírito animal’. 

Muito mais inteligente que propor leis que obriguem a redução de emissões de gazes de efeito estufa é assegurar o interesse do setor produtivo em participar deste esforço, despertando sua motivação para o ganho.

Se é mais, ‘[...] pela consideração que tem pelos seus próprios interesses’ do que por motivos altruístas, pouca diferença faz, desde que o resultado preserve o meio ambiente e por consequência nossa presença no planeta.


Dr. Marcos J. G. Rambalducci, Economista, é Professor da UTFPR. Escreve às segundas-feiras.