15 de agosto de 2022

2022/08/15

Olá, meus caros.

A Argentina vive o drama de uma inflação oficial acima de 70% em 12 meses e flerta com uma nova crise cambial, com explosão do dólar no mercado paralelo informal, lá conhecido como câmbio blue.

Em vez de utilizar a moeda local (o peso argentino), que perde valor com a inflação e as desvalorizações, a população recorre ao dólar no dia a dia, especialmente para compras maiores.

Da mesma forma que aqui, lá também as famílias de baixa renda não tem acesso fácil a dólares e vêm o salário sendo corroído pela inflação que culmina com um cenário de aumento da pobreza, que ultrapassa em muito, o que vivenciamos por aqui.

Entender o que leva nosso vizinho a tal situação é a forma inteligente de evitar o mesmo caminho.

A atual crise na Argentina, embora agravada com os efeitos da pandemia, da guerra na Ucrânia ou da ruptura nas cadeias globais de suprimentos, seu nascedouro é bem anterior e resultado de um excesso de endividamento, especialmente de dívidas em dólares.

Tendo ultrapassado 100% de seu PIB em 2020, sua dívida pública encerrou 2021 em 81% e média de 90% nos últimos 4 anos, sendo mais da metade dela em dívida externa, o que obriga o país a ter dólares para quitar seus vencimentos.

A dívida pública é resultado do descompasso entre o que é arrecadado e o que é gasto pelo governo. Em 2020 o país gastou próximo a 18% mais do que arrecadou, cerca de 6,5% de seu Produto Interno Bruto.

E, em vez de se comprometer com a adoção de medidas de austeridade e com o cumprimento das metas entre o que gasta e o que arrecada, o governo emite mais moeda para bancar políticas sociais e subsídios a produtos como combustíveis e transportes públicos. 

Ora, aumentar a quantidade de moeda obviamente vai causar ainda mais inflação, pois a quantidade de bens e serviços não aumenta porque há mais moeda disponível. O financiamento do descontrole dos gastos via emissão de moeda jamais vai permitir o controle da inflação.

E pior é que há sabotadores internos. Tendo pedido socorro ao FMI, o governo argentino fechou acordo em março deste ano, que lhe permitiu refinanciar parte de sua dívida se comprometendo em diminuir o rombo anual nas contas públicas, mas uma ala do governo, liderada pela populista Cristina Kirchner, cria todo tipo de empecilho para concretizar um plano de austeridade fiscal.

Então veja, ter um dispositivo limitador dos gastos é conter a fome de poder de quem se elege, impedindo que a máquina pública seja usada de maneira irresponsável, o que normalmente acontece para sustentar projetos de manutenção no poder de um partido político ou de um personagem político.

O Teto de Gastos, com todos os problemas que ele tem, foi sim a medida fiscal mais importante que o país adotou nos últimos anos, justamente porque procura impedir que cresça o endividamento e leve a processos de alta inflação, aumento dos juros, queda na confiança dos investidores, diminuição nos investimentos e na geração de emprego e renda.

E é fato que o atual governo e candidato a reeleição já conseguiu distorcer e driblar este controle de gastos nas contas públicas, e o postulante oponente não demonstra qualquer disposição em trilhar um caminho voltado a equilibrar arrecadação com despesas.

E essa situação é preocupante porque nos aproxima cada vez mais da situação vivenciada pela nossa vizinha Argentina. Parece que de novo teremos que optar pelo menos pior.


Pensa nisso, te vejo na próxima coluna e até lá se cuida.

Marcos J. G. Rambalducci - Economista, é Professor da UTFPR.