14 de junho de 2021

14-06-2021_-_ECONOMIA_PARA_TODOS

Olá meus caros. A dívida pública é um indicador que importa, e muito, pelo menos para uma parcela significativa de economistas, na qual me incluo. Acreditar que não há limites para um aumento da despesa pública é, na minha opinião, a receita certa para lançar qualquer nação em grave crise econômica.

O indicador mais utilizado para medir o tamanho da dívida de um país é compará-lo com seu PIB, que é a soma de tudo o que uma economia produziu. É o mesmo que comparar o quanto você deve em relação ao quanto você ganha. É um indicador interessante porque uma dívida de R$ 5.000 para quem ganha R$ 4.000 é muito maior que os mesmo R$ 5.000 para uma pessoa que ganha R$ 30.000. 

E é claro, um país com elevada relação dívida/PIB será visto como uma economia de maior risco para o investimento, o que eleva as taxas de juros pelo receio que tem o investidor de perder o que investiu. Além disso reduz a capacidade de investimentos públicos e a aplicação de políticas anticíclicas. Lembrando que política anticíclica é aquela que busca um equilíbrio – se a economia está muito aquecida, o governo adota medidas que suavizem uma onda de crescimento acelerado demais e quando a economia está em baixa, o governo aciona mecanismos para reativar a economia. Por isso anticíclica.

Mas para uma grande surpresa, a dívida pública do Brasil, em plena pandemia, está caindo em vez de subir. Dedico a coluna de hoje para trazer entendimento a este fenômeno aparentemente contraditório.  

A preocupação com nossa dívida não é de agora. Em 2016 Relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgava alerta para o crescimento da dívida para 73% do PIB, valor 30% mais alto que a média das economias emergentes e a preocupação era com a perda de ‘margem de manobra’ do governo para empregar seu caixa em medidas necessárias para a economia em momentos de crise.

O professor e economista Affonso Celso Pastore, que foi presidente do Banco Central na década de 1980,  em evento promovido pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pela Instituição Fiscal Independente (IFI) em abril deste ano, vaticinou que a dívida pública iria crescer e ultrapassar a linhas dos 100% do PIB.

Segundo Pastore, ainda que o Brasil cumpra rigorosamente a regra do teto de gastos em 2021, as perspectivas otimistas ainda apontariam que um recuo para a casa dos 90% somente aconteceria em 2037.

Mas é ingrata tarefa de tentar prever o futuro. 45 dias depois desta fala, analistas reavaliaram e passaram a estimam que a dívida pública, que batia nos 96% em outubro, agora chegará ao final do ano a 82% do PIB. 

O Valor Econômico de sexta-feira (11) traz a fala do economista chefe da Tullet Prebon, Fernando Monteiro, que sintetizou desta forma a situação vivida pela dívida: “Sumiu uma Argentina da dívida bruta/PIB e apareceu um Uruguai nas receitas”, numa referência ao PIB destas economias e na diferença entre o que era esperado e o que se está verificando. 

Uma relação Dívida/PIB de 96% que cai para 85,6% (valor ainda a ser divulgado pelo Banco Central para o mês de maio), é muita diferença para um espaço de 6 meses. O que explica tal comportamento?

Como disse a pouco, a relação Dívida/PIB é obtida exatamente desta forma – uma operação de divisão onde a Dívida está no numerador, ou seja, na parte de cima da divisão e o PIB no denominador, na parte de baixo da divisão. Para alterar esta relação para baixo basta diminuir o numerador ou aumentar o denominador, ou ambos. 

Agora veja. O Banco Central corrige o PIB com base na inflação do período. A inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), acumula alta de 8,06%, bem acima dos 2,13% projetados no orçamento. Corrigindo o PIB por esta inflação maior, claro que seu valor nominal vai aumentar e que faz com que a relação dívida PIB caia.  

Em relação ao comportamento da economia, o orçamento previa crescimento do PIB de 3,2% para 2021. Mas, somente no 1º trimestre o crescimento foi de 1,2% o que levou a novas projeções para o PIB anual que ultrapassam os 5%. De novo, o PIB ficou maior, o que ajudou novamente a fazer com que a relação dívida PIB caísse.

E tem um terceiro componente nesta conta que é o aumento da arrecadação do governo com os impostos diante do crescimento maior da economia. Antes a previsão era de um déficit primário acima de 3% e agora as projeções são de um déficit primário abaixo de 2%, o que significa que a dívida pública irá aumentar menos que o previsto no orçamento. Neste caso, foi o valor no numerador que ficou menor que o previsto, atuando para que novamente a relação dívida PIB caísse ainda mais.   

Em resumo, crescimento do PIB maior que o esperado, inflação muito acima da meta e arrecadação maior que a prevista levaram a anteciparmos a redução da dívida pública  15 anos antes das previsões do Celso Pastore. Tudo isso, como você pode deduzir, não é garantia nenhuma que esta dívida vai se manter controlada, e pessoalmente não estou convencido de que a redução da dívida/PIB seja fruto da atuação do governo. No entanto, sua queda não deixa de ser fato a ser comemorado.

Pensa nisso, Nos vemos na próxima coluna e até lá, se cuida.